Desde o início dos anos 2000, a tarifa média paga para voar no mercado doméstico caiu quase à metade. Hoje, 100 milhões de brasileiros voam de avião, três vezes mais do que naquela época.

Depois de um período em que o governo controlava desde a compra de aeronaves e o número de companhias autorizadas a atuar no mercado, em quais rotas e quanto elas poderiam cobrar, o setor foi se abrindo gradualmente a partir de 1992, num movimento que durou até 2001, quando a liberdade tarifária passou a ser total. O ambiente cada vez mais competitivo levou a entrada de novas empresas. Para os passageiros, o resultado foi mais opções de serviços e queda no preço das passagens.

Até 2001, as empresas tinham um teto para as tarifas estabelecido pelo governo, que também definia as regras de cancelamento e de remarcação de bilhetes. Praticamente todos os passageiros pagantes desembolsavam a mesma quantia para garantir um lugar no voo. Em caso de viagens com mais de uma classe (Primeira, Business e Econômica), havia uma única tarifa para cada seção.

A desregulamentação tarifária permitiu às empresas praticar tarifas distintas, atendendo a diferentes perfis de consumidor. Isso levou à inclusão de passageiros de primeira viagem, em um mercado então dominado por viagens a negócio, com pouca gente viajando muitas vezes.

Para maximizar as receitas e garantir mais assentos ocupados, as empresas aéreas, aqui e no resto do mundo, passaram a dividir os passageiros em dois grandes grupos, de acordo com o tipo de viagem: viajantes a negócios e os a lazer. Os primeiros estão dispostos a pagar mais pela conveniência de comprar em cima da hora, poder desistir da viagem ou alterar o voo. Já o segundo grupo é totalmente sensível a preço.

Além dos perfis de passageiros, são adotados ainda critérios como antecedência de compra, horário de embarque, dia da semana (terças, quartas e sábados costumam ser mais baratos), se é véspera de feriado ou alta temporada, se pontua milhas, se permite cancelar ou remarcar.

Aeroporto Internacional de Viracopos

“Se fosse cobrado um valor único pela passagem, o acesso ao transporte aéreo daqueles clientes mais sensíveis ao preço seria prejudicado. Por outro lado, se os valores fossem sempre muito baixos, não haveria assentos disponíveis para quem compra de última hora”, explica a Gol, empresa que surgiu em 2001 com uma agressiva política de preços promocionais, estimulando a competição no setor.

O volume de tarifas a ser ofertado para cada classe ou perfil é definido voo a voo, dia a dia, fazendo com que os preços oscilem com o tempo, constantemente. Esse sistema é chamado de precificação dinâmica e é realizado com o auxílio de algoritmos altamente sofisticados.

O setor aéreo foi pioneiro na adoção da precificação dinâmica, que hoje vem sendo popularizada por aplicativos de transporte urbano como o Uber, que aplica tarifas cujos valores não dependem apenas da distância, mas da procura pelo serviço em determinados horários.

“Esta engenharia de receita é possível graças à liberdade tarifária, uma conquista importante para todos os passageiros e para democratizar a viagem de avião no Brasil”, afirma a Latam, empresa que nasceu regional no interior de São Paulo e que, com a liberalização do setor, passou a competir de igual para igual com as empresas nacionais.

“Sem a liberdade tarifária e a segmentação de preços, teria sido impossível oferecer um mix de tarifas aos consumidores e conseguir até mesmo cobrir os custos operacionais da maioria dos voos. Com diferentes tarifas na prateleira, os passageiros de negócios continuam encontrando suas passagens aéreas na véspera do voo, e o viajante de lazer consegue se programar para viajar de avião com os preços mais acessíveis -mesmo que, para isso, precise cumprir algumas regras de utilização.”

A economia aquecida e os preços em queda levaram a aviação a exibir taxas de crescimento acima de 10% por mais de uma década a partir de 2002. “Fala-se do crescimento da classe C, mas o que trouxe o brasileiro para o avião foi a queda do preço”, informa a Latam.

Para seguir crescendo na próxima década, as companhias aéreas defendem a ampliação da liberdade tarifária, aos moldes do que acontece em mercados maduros como a Europa e os Estados Unidos, onde as empresas podem cobrar por uma série de extras, como bagagens despachadas. De acordo com a Latam, “em todo o mundo houve queda do preço da tarifa piso onde foi aplicada a cobrança de bagagem. Se a liberdade tarifária foi o fator preponderante para democratizar a viagem de avião no Brasil na última década, o acesso a tarifas ainda mais econômicas é o que vai permitir expandir o mercado no país daqui para a frente. E isso só será alcançado com preços ainda mais acessíveis, com o passageiro escolhendo exatamente por quais serviços quer pagar”.

Segundo a pesquisa “Flight Price Index 2017”, elaborada pela agência online de viagens Kiwi.com, o Brasil ocupa o primeiro lugar em um ranking mundial das passagens aéreas domésticas mais baratas. Os voos internos são feitos, exclusivamente, por companhias brasileiras, o que faz o país ter os valores mais vantajosos do mundo: é cobrado R$ 3,98 a cada 100 km voados. A autonomia no custo de despacho de bagagens pode ajudar o valor a diminuir ainda mais.

Nos Estados Unidos, a cobrança pelo despacho de bagagem, liberada em 2008, ajudou a minimizar desde gastos com equipagem perdida até mesmo despesas trabalhistas. Com menos malas para despachar, além de precisar de menos funcionários, houve menos queixas, processos e afastamentos por lesões. Em 2009, um ano após o início da cobrança, as companhias aéreas americanas ainda economizaram US$ 94 milhões em bagagens perdidas ou danificadas. Para pagar menos, um em cada quatro passageiros optou por não despachar bagagem em 2009. No ano anterior, um em cada seis não despachou mala.

Fonte: Folha de São Paulo