O pedido, que pode ou não ser acatado pela Justiça, foi anunciado inicialmente pelo site de notícias jurídicas Jota, mas foi confirmado à BBC Brasil por fontes do MP-SP.
Na denúncia contra o ex-presidente, a Promotoria afirma que o petista escondeu a posse de um tríplex no Guarujá e que este teria passado por reformas feitas pela empreiteira OAS para Lula.
O ex-presidente alega que não é dono do apartamento e que ele e a ex-primeira dama, Marisa Letícia, visitaram o imóvel apenas uma vez para avaliar a possibilidade de adquiri-lo, mas desistiram.
A aquisição seria por meio de cotas negociadas pela cooperativa Bancoop, mas a defesa do ex-presidente alega que ele desistiu da compra após a quebra da cooperativa e porque a obra teria encarecido demais.
Em nota, o advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, afirma que a fundamentação apresentada pelos promotores para justificar o pedido é “uma tentativa de banalização do instituto da prisão preventiva”.
“Lula jamais se colocou contra as investigações ou contra a autoridade das instituições. Mas tem o direito, como qualquer cidadão, de se insurgir contra ilegalidades e arbitrariedades. Não há nisso qualquer ilegalidade ou muito menos justificativa jurídica para um pedido de prisão cautelar”, diz o texto.
O advogado argumenta que o pedido não traz um fato concreto para justificar as acusações contra o ex-presidente e seus familiares, e que não há nada além de “hipóteses”.
O coordenador jurídico do PT-SP, Marco Aurélio de Carvalho, disse à BBC Brasil que o pedido “é frágil e inconsistente” e é visto com “preocupação”.
“Estávamos sensibilizando a militância para o não enfrentamento, e para não ir às ruas, e com esse pedido de prisão preventiva não sabemos como será a reação”, afirmou.
Segundo ele, a militância pode rever a decisão de não protestar no domingo – quando estão agendadas também manifestações contra a presidente Dilma Rousseff -, e isso tornaria a medida do MP-SP “irresponsável”.
Na véspera, os mesmos promotores do MP – José Carlos Blat, Cassio Conserino e Fernando Henrique Moraes de Araújo – denunciaram Lula por lavagem de dinheiro e falsidade ideológica no caso do tríplex do Guarujá, no litoral de São Paulo.
Em nota, o Instituto Lula acusa Conserino de usar o cargo para fins políticos e de parcialidade. O texto afirma ainda que Conserino “não é o promotor natural deste caso” e não ouviu o ex-presidente antes de denunciá-lo. Ainda de acordo com a nota, o promotor “possui documentos que provam que o ex-presidente não é proprietário nem de triplex no Guarujá nem de sítio em Atibaia, e tampouco cometeu qualquer ilegalidade”.
Também foram denunciados na quarta-feira a mulher de Lula, Marisa Letícia, e um de seus filhos, Fábio Luís Lula da Silva, além de outras 13 pessoas.
Já o pedido de prisão preventiva inclui, além de Lula, o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro e do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, Fábio Hori Yonamine e Roberto Moreira Ferreira, diretores da OAS, Ana Maria Érnica, ex-diretora da cooperativa Bancoop e Vagner de Castro, ex-presidente da organização.
Segundo aliados do ex-presidente, o Ministério Público estaria “agindo politicamente” para inviabilizar sua candidatura em 2018.
Nesta quinta-feira, os três promotores negaram, em entrevista coletiva, que a apresentação de denúncia tenha qualquer motivação política.
Mas quais podem ser as consequências jurídicas do pedido de prisão preventiva e dessa denúncia para Lula?
Para começar, a denúncia do Ministério Público Estadual não significa que o ex-presidente tenha virado réu na ação criminal. Isso só acontecerá se a Justiça aceitar a denúncia.
O pedido de prisão preventiva também pode ou não ser acatado pela Justiça.
Os promotores justificam o pedido dizendo que Lula “sabidamente possui poder de ex-presidente da República, o que torna sua possibilidade de evasão extremamente simples”.
É possível, por exemplo, que a Justiça acate a denúncia mas não o pedido de prisão preventiva se julgar que esse risco de evasão não existe.
Por ora, a denúncia não atrapalha uma eventual candidatura de Lula à Presidência em 2018. Na sexta-feira, após ser levado para depor pela Polícia Federal por meio de um mandato de condução coercitiva, o petista indicou que teria planos de concorrer.
A pena para o crime de lavagem de dinheiro é prisão de três a dez anos e multa. Já o crime de falsidade ideológica pode render pena de um a cinco anos de reclusão e multa.
A denúncia do Ministério Público de São Paulo não está diretamente ligada à operação Lava Jato – apesar de os investigadores desta operação também estarem averiguando o caso do tríplex.
Outro lado
O ex-presidente negou em diversas ocasiões ser dono do tríplex no Guarujá.
Na quarta-feira, a defesa do petista disse a diversos veículos de imprensa que não conhece o conteúdo da denúncia do MP-SP, mas que ela era esperada, pois o promotor Cássio Conserino já havia dito à revista Veja que ela ocorreria.
Para o advogado Cristiano Zanin Martins, isso demonstraria a “parcialidade” da apuração.
O Instituto Lula disse, em nota, que a denúncia visa “macular a imagem” do ex-presidente.
O instituto também questiona a competência legal da Promotoria de SP para investigar o caso, que também faz parte das apurações da Lava Jato.
Entenda o caso
A suspeita da Promotoria é de que o tríplex 164-A do Condomínio Solaris, na praia de Astúrias (Guarujá), seria de posse de Lula, e que teria sido reformado por uma empreiteira, a OAS. O ex-presidente estaria escondendo a posse do tríplex.
José Adelmário Pinheiro, o Léo Pinheiro, um dos sócios da OAS, também foi denunciado.
As acusações seriam baseadas, entre outras coisas, em depoimentos de funcionários do condomínio ou ligados a OAS de que Lula e Marisa teriam estado no tríplex para supervisionar sua reforma.
De acordo com alguns desses funcionários, a OAS também teria pedido a eles que não se falasse sobre a ligação do imóvel com o ex-presidente.
O Ministério Público Federal no Paraná, que lidera outra frente de investigação – a Operação Lava Jato – sobre o mesmo apartamento, diz que Lula recebeu, em 2014, pelo menos R$ 1 milhão “sem aparente justificativa econômica ilícita” da construtora OAS, por meio de reformas e móveis de luxo no tríplex.
Os procuradores dizem ter provas de que a OAS pagou para reformar o imóvel (mais de R$ 750 mil) e arcou com móveis de luxo para cozinha e dormitórios (cerca de R$ 320 mil).
Eles afirmam ainda que tudo aconteceu de maneira “não usual”, uma vez que o apartamento foi o único do prédio a ter recebido as benfeitorias, contando, inclusive, com o envolvimento pessoal do próprio presidente da construtora, Léo Pinheiro.
Segundo o MPF, a suspeita é de que a reforma e os móveis seriam uma contrapartida pelo favorecimento da empreiteira no esquema de corrupção da Petrobras. Executivos da OAS já foram condenados por corrupção e lavagem de dinheiro na Lava Jato.
No âmbito da Lava Jato, até o momento Lula não foi denunciado e nem indiciado – o que ocorre quando a polícia conclui haver indícios suficientes do crime.
Segundo o Instituto Lula, em 2005 Marisa, mulher de Lula, tornou-se associada à Bancoop (cooperativa habitacional do Sindicato dos Bancários de São Paulo), então responsável pela construção do Solaris, adquirindo uma cota-parte do empreendimento. A Bancoop teria reservado o apartamento 141 (padrão) para sua família, que teria pago R$ 179 mil à cooperativa.
Em 2009, o Solaris foi transferido para a OAS em função de problemas financeiros da Bancoop. Depois disso, a família teria decidido não comprar a unidade 141.
A cota-parte do empreendimento foi declarada no imposto de renda do presidente e em sua declaração de bens como candidato à reeleição. “O ex-presidente jamais ocultou seu único e verdadeiro patrimônio no Guarujá: a cota-parte da Bancoop”, diz nota do Instituto Lula.
Segundo o instituto, Lula e Marisa teriam visitado uma única vez o triplex 164-A para avaliar a possibilidade de compra, mas não compraram o imóvel e, em novembro, desistiram definitivamente de seu “direito de compra” no Solaris.